sexta-feira, 1 de abril de 2022

131 - ANARQUIA E CIVILIZAÇÃO (QUASE) PERFEITA

 

(Joan Snyder - See what a life… 2010)
 

Aos textos precedentes, acrescento, depois de algum tempo, um adendo fundamental. Tenho pensado na sociedade ideal ou numa sociedade menos bárbara e mais civilizada. Mas, a sociedade realmente ideal – por mais utópica que isso possa parecer – será constituída em cima de dois pilares ou de dois princípios: a ausência de deus e a ausência de leis. Ou seja, a anarquia quase absoluta. Quando o homem não precisar de deus ou de deuses; quando o homem não precisar mais de leis que regulem sua conduta, então teremos – aí, sim – o super-homem, o homem em sua grandeza absoluta, o homem totalmente desprovido de quaisquer resquícios de barbárie. O caminho será longo, tortuoso e complexo: passará por muitas tentativas de aperfeiçoamento dos sistemas democráticos, o que é absolutamente necessário, até chegar a uma regulação quase total de todos os atos humanos, numa espécie de ditatura legislativa, em que tudo, absolutamente tudo, será regulado, desde os atos mais comezinhos do dia a dia, até as atitudes heroicas e patrióticas. Então, a guerra terá sido suprimida do imaginário humano. E pouco a pouco, a noção de assassínio também será eliminada. E o ser humano – cansado de tantas regras e leis, purgados os seus instintos mais bárbaros – começará a dar conta de que o respeito ao outro é que deve ser a lei fundamental, não escrita, mas internalizada. Aí, sim, todos os regulamentos, todas as leis, todas as regras deverão ser queimados, já que a memória de deus ou de deuses terá sido definitivamente expurgada da mente humana, e o novo “super-homem” viverá, enfim, livre de todas as amarras e não precisará nem de deus nem de leis, porque terá alcançado a suprema noção de respeito a si, ao outro e à natureza, ao meio em que vive. Sem conceitos babacas de humanismo tosco, como o que existe na máxima cristã do “amai-vos uns aos outros”, cada ser humano olhará seu semelhante e verá que a vida que flui em suas próprias veias é a mesma vida que flui no outro e que deve ser respeitada. O outro não mais será o inimigo, mas apenas o outro, com quem conviverá quando necessário, em harmonia, em contratos individuais de paz e de respeito. E essa última palavra, respeito, é que ditará todas as condutas, sem necessidade nem de intervenções e ameaças divinas nem de regras e leis estúpidas. Os governos não mais serão governos, mas apenas órgãos de administração dos bens públicos mantidos com o pagamento não mais compulsório, mas acordado em função das necessidades, dos impostos de todos os cidadãos, conforme a capacidade real de cada um. A anarquia absoluta é mais do que impossível, como se pode deduzir, mas a anarquia consensual, em que o cidadão sabe de suas responsabilidades perante o todo da sociedade e do meio-ambiente, essa será, sem dúvida o ponto culminante da evolução do homem como ser gregário, já que a perfeição – se e quando atingida – decretaria a própria extinção do homem, esteja ele onde estiver, nesse universo sem fim.

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