domingo, 25 de setembro de 2022

187 - PALAVRA FINAL: O ALÉM DO HOMEM

 

(Vincent van Gogh)


Tenho plena consciência de que tudo quanto eu escrevi até agora constitui um rio caudaloso, uma pororoca, sobre a qual você, leitor ou leitora, pode surfar ou, então, na qual você pode mergulhar e contemplar e, até mesmo, pescar os peixes que são arrastados por suas ondas, ou, ainda, naufragar para sempre e abandonar o grande rio que, um dia, chegará ao oceano e, embora sejam volumosas as águas desse rio, não conseguirá interferir, a não ser minimamente, na temperatura, na cor e no gosto da grande salmoura. Mas será apenas o começo. Outros rios hão de vir e despejar tantas águas que, numa alvorada qualquer, até o oceano se sentirá incomodado. Nesse dia, o obscurantismo começará a ser vencido e o ser humano que emergirá desse oceano de barbárie será, afinal, o além do homem.



FIM





4.10.2006

quinta-feira, 22 de setembro de 2022

186 - CONSTRUÇÃO E DESCONSTRUÇÃO DOS DEÍSMOS

 

(William-Adolphe Bouguereau, 1825-1905 - La jeunesse de Bacchus)


Também os demais deísmos espalhados pelos inúmeros recantos da Terra foram fruto da ignorância da relação do ser humano com as forças da natureza e da tentativa de interpretação dessas mesmas forças por indivíduos mais espertos que os outros, que se denominaram intermediários da relação entre os humanos e o desconhecido, por sua vez interpretado como demonstração da existência de deus ou deuses criadores ou administradores dessas forças. Por mais que, afogados na estupidez dessas crenças, os sumos sacerdotes dessas crenças ameacem e persigam aqueles que não os seguem, todas, absolutamente todas as seitas e religiões deístas se incluem no conjunto construtor do edifício deísta que, um dia, vai desabar. Naturalmente, como já frisei. Independente da vontade de quem quer que seja, como reitero. E quando todo esse edifício podre ruir, o ser humano ficará completamente desnudo diante de si mesmo. Trapezista que se vê solto no espaço sem rede, o alumbramento da verdade cegará as mentes não preparadas para a verdade. Felizmente, como já afirmei e, cansativamente, torno a afirmar, esse processo de destruição do discurso deísta levará séculos, talvez milênios. Só espero que não venha tarde demais.

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

185 - CRISTIANISMO É SÓ DISCURSO

 

 (Francois Xavier Fabre - Mor d'Abel, 1791)


A construção do edifício deísta cristão e ocidental foi um longo processo de construção de um discurso. Somente discurso. O ser humano se deixa levar pelas palavras, mais do que pelos fatos. As únicas provas da existência dos deuses ocorreram no terreno da pseudo-lógica, através de argumentação complexa, em que o discurso substituiu e subverteu a lógica dos fatos e, tirando a comprovação do terreno da ciência ou, pelo menos, do experimentalismo, para o transcendente, obteve uma das mais fantásticas elucubrações humanas. Esse majestoso edifício contou com a base filosófica grega: Sócrates, Platão, Aristóteles e todos os construtores de transcendência. Mais tarde, a sagacidade de Tomás de Aquino obliterou de vez o pensamento racional, levando o cristianismo, a principal seita ocidental, aos caminhos da fé cega, da crença absoluta. Para isso, contou, é claro, com as próprias necessidades humanas de superar suas dores, suas decepções e, acima de tudo, com a vontade humana, demasiado humana, de imortalidade.

sexta-feira, 16 de setembro de 2022

184 - O RESPEITO

 

 (Pietr Bruegel - the_Elder - Children’s_Games)


Já disse e repito: não há absolutamente nada para se colocar no lugar do deísmo. Ou seja, não acreditar em deus ou deuses, em metafísicas e transcendências não implica buscar novas formas de crenças, de fé ou de metafísicas. No entanto, não há desespero ou pessimismo no pensamento ateu. Pessimismos e desesperos são condições humanas, além de quaisquer crenças filosóficas e são atinentes a estados mentais, a situações de vida, a condições químicas do cérebro e, até mesmo, dos demais órgãos de nosso corpo. Portanto, não há pessimismo no pensamento ateu. Há apenas a liberdade. Não pensar em deus, não cultuar doutrinas baseadas apenas na fé, não aceitar a metafísica, tudo isso é libertar a mente para aceitar as leis da natureza, é voltar o pensamento para nós mesmos, e criar uma nova forma de humanismo, em que o ser humano passa a ser, efetivamente, o centro de suas próprias preocupações, sem que isso o leve ao egocentrismo, à arrogância de pensar que é criatura e, portanto, pode fazer e desfazer o mundo em que vive, porque está tudo escrito ou determinado por uma consciência superior. Pensar de forma ateia é libertar a nossa mente do determinismo torpe em que ela se jogou até hoje e poder olhar o futuro como construção e não como fato consumado. O ser humano evolui a cada segundo, mas essa evolução é lenta e cautelosa. Não depende de forças externas à própria vida e à natureza: só depende de si mesma, da composição de fatores que devem fazer que a humanidade supere o estado de barbárie em que se encontra, agravado por pensamentos mágicos. Há que cessar a matança. Há que controlar a explosão demográfica. Há que se consolidar o pensamento de que a vida é o único bem e o mais precioso de todos. O ser humano caçador de si mesmo deve dar lugar ao ser humano planejador, racional e verdadeiramente humano, livre de toda e qualquer peia que lhe trava a possibilidade de buscar o seu próprio destino. Mas há um longo, longuíssimo caminho até que isso venha a acontecer. Não estou prescrevendo a eliminação do deísmo a ferro e fogo. Porque seria trocar uma barbárie por outra. O despertar da consciência é um projeto natural da condição humana. Vai acontecer, independentemente dos esperneios e estrebuchos deístas, das maldições que lançam sobre aqueles que pensam diferente os que temem perder o fio da vida, porque não há mais deuses, porque não há mais fé. A essas mentes opacas e obscurecidas pelas crenças inúteis só posso deixar o meu riso de compreensão, não de escárnio. Devo dizer-lhes que o seu deus, a sua fé e as suas crenças metafísicas ainda viverão e sobreviverão por muitos e muitos séculos, para desgraça da evolução do pensamento verdadeiro e natural do ser humano. E quando acontecer a destruição completa de todos os altares, as piras ainda arderão por outros tantos e tantos séculos. O pensamento ateu, a descontaminação ecológica do pensamento humano, isso não é exatamente um projeto com o qual eu esteja comprometido ou pelo qual alguém possa lutar, mas é a evolução natural do pensamento humano. Um dia acontecerá. Naturalmente. Sou, infelizmente, para desgraça de muitos, somente um arauto, nem profeta nem desbravador, apenas alguém, infinitamente pequeno, nesse mar de angústias que assola a humanidade atolada em miséria, em guerras, em destruição, que tem um ainda infinitamente pequeno alumbramento das possibilidades do ser humano, alguém que apenas luta por uma humanidade um pouco melhor, apesar de todos os instintos animalescos que fazemos questão de conservar e cultuar. Não tenho compromisso com nenhum ramo de pensamento, com nenhuma organização ou seita ou partido político ou academia ou seja o que for que se inventou para reunir pessoas. Não têm minhas diatribes nenhuma intenção de arregimentar seguidores ou influenciar pessoas. Por isso, não faço nenhuma questão que me leiam, que me compreendam, ou mesmo que ouçam minhas palavras. Discuto-as, sim, porque sou livre para isso. Mas não as imponho. Apenas não quero mais ouvir os argumentos dos deísmos estupidificadores, porque já os conheço há muito, já os degluti e os vomitei há tantos anos, que não tenho mais paciência para historinhas ou contos de fadas e duendes. Não mais preciso deles, como eles não precisam de mim. Quero, apenas, que eles se calem, pelo menos em relação a mim. Assim como tiveram o direito de envenenar a mente humana por tantos milhares de anos, posso reivindicar para mim um segundo de atenção, uma gota de orvalho na infinidade do meio aquático, para, humildemente dizer que há caminhos diferentes para a mente do ser humano trilhar, muito além das metafísicas e das transcendências que criaram como obrigação ab-ovo do pensamento humano. A liberdade de ir além, de buscar, de não nos deixar envolver por raciocínios criados para embaralhar a percepção da natureza e de suas leis deve ser o primeiro passo para que possamos dar os primeiros passos para o entendimento entre as pessoas, baseado num princípio fundamental e numa postura que nenhum deísmo até hoje levou ao pé da letra: o respeito.

segunda-feira, 12 de setembro de 2022

183 - É PRECISO ACEITAR A DIVERSIDADE

(Bia Leite)


O ser humano estranha o ser humano. Sempre foi assim. Civilizações inteiras foram e ainda são destruídas por conta do estranhamento, da não compreensão do diferente. Porque só aceitamos aquilo que compreendemos. E isso precisa mudar. Cabe ao ser humano civilizado, no sentido mais amplo da palavra, buscar soluções para o entendimento entre as pessoas diferentes, entre os povos diferentes, sem cair nas armadilhas da metafísica e do deísmo inconsequente que, eles também, o deísmo e a metafísica, têm trazido muitas incompreensões. As três grandes religiões (cristã, judaica e islâmica) dizem adorar o mesmo deus, mas o fazem de maneiras tão diversas, que não conseguem se entender. Em vez de contribuir para a paz entre os seres humanos, cavam fossos profundos entre si, acumulando ódios e rancores de tal monta, que colocam em risco a própria existência. Estranham-se da mesma forma como fomos levados pela propaganda, pelo cinema e por todos os meios de comunicação, a crer que tudo o que é diferente pode conter o mal. Obliteramos nossa razão como o pensamento do medo, da destruição ou da rejeição de formas de vida, culturas e costumes que não sejam aqueles com que estamos acostumados, em nosso pequeno mundo particular. É sempre preciso esconder o diferente: famílias há que, ainda hoje, jogam nos porões ou em quartos fechados os rebentos que não nasceram na conformidade esperada, ou seja, sadios ou de acordo com o que entendemos por normalidade. Na natureza, os filhotes defeituosos são descartados, por não se adaptarem, mas entre os humanos isso se torna cada vez mais uma anomalia absurda, diante das imensas possibilidades de adaptação, mesmo em condições adversas, que desenvolvemos ao longo desses milhões de anos de evolução. Não se concebe, portanto, que continuemos com ideias absurdas de estranhamento; que gastemos milhões de recursos cada vez mais escassos para destruir aquilo que nos incomoda; que não levemos em conta a nossa racionalidade para lidar com o diferente, diante de tantos avanços técnicos e científicos. Positivamente, o ser humano só evoluirá satisfatoriamente quando perceber que há uma única raça humana, e que essa raça tem diversidades fantásticas, que devem ser respeitadas e compreendidas

sábado, 10 de setembro de 2022

182 - NÃO HÁ ÓDIO NO ATEÍSMO

 

(Edvard Munch - Fertility II)


A veemência com que critico o deísmo pode levar a interpretações errôneas: eu não odeio o deísmo e, principalmente, não odeio os deístas. Acho-os, a ambos, um desastre para a humanidade. Mas não há nisso nenhum ódio, apenas a constatação de fatos que estão à vista de todos que não tenham sua visão obliterada por pensamentos mágicos ou metafísicos. O que existe de mais cruel no deísmo é que ele não permite que o ser humano assuma o seu lugar na corrente da vida, na corrente do evolucionismo. Não deixa, por exemplo, que a humanidade perceba que, assim como milhares de espécies surgiram, desenvolveram-se e desapareceram, muitas sem nem deixar vestígios, o ser humano também integra esse mesmo equilíbrio instável de, um dia, entrar na lista dos animais em extinção. Com sérios agravantes: crescemos e nos multiplicamos descontroladamente, apesar de termos conhecimento e técnica para controlar esse crescimento; temos, também, conhecimento e técnica para controlar o meio-ambiente de tal forma que não o depredemos e o tornemos hostil a nós mesmos, mas, mesmo assim, continuamos poluindo e destruindo o planeta onde vivemos; e ainda: temos noção clara dos perigos que nos levam à morte e à destruição, mas, mesmo assim, continuamos com políticas de exclusão e de ódios aos que são diferentes, provocando guerras cada vez mais destrutivas ou construindo armas cada vez mais potentes. A estupidez humana não é culpa exclusiva do deísmo. Mas deve muito a ele. Não posso afirmar que, sem as armadilhas filosóficas da metafísica e do deísmo, o homem resolveria todos os seus problemas, mas posso afirmar que sua ausência contribuiria significativamente para avançarmos no caminho da resolução de inúmeros problemas que afligem a humanidade e que colocam em risco a sua existência. Não teríamos, pelo menos, os julgamentos morais de seres humanos que ousam arriscar e buscar novos conhecimentos e novas tecnologias. E poderíamos entender melhor o universo em que vivemos, com suas leis ainda muito longe de serem totalmente decifradas, e poderíamos ter evitado ou ainda evitar muita dor e muito derramamento de sangue, para galgar mais um degrau do conhecimento.

quarta-feira, 7 de setembro de 2022

181 - CONSCIÊNCIA DA PEQUENEZ

 

(Baobá: foto de autoria não identificada)

É preciso ouvir a vida, para compreendê-la. É preciso amar a vida, para respeitá-la. Vida não é dom: é condição. E as leis da natureza não têm nenhum tipo de comiseração para com o desrespeito à vida: se não se adaptar, desaparece. E o universo não se abalará nem um pouco com o desaparecimento de todo um ecossistema complexo, como o planeta em que vivemos, ou simples, como uma colônia de seres monocelulares no fundo do oceano. Temos todos o mesmo valor diante da imensidão do universo: nada.

187 - PALAVRA FINAL: O ALÉM DO HOMEM

  (Vincent van Gogh) Tenho plena consciência de que tudo quanto eu escrevi até agora constitui um rio caudaloso, uma pororoca, sobre a qual ...