quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

106 - CONTRA TODAS AS METAFÍSICAS

 

(Thomas Bühler: Narrenschiff, a nau dos insensatos)

Barbárie. Uma mulher depõe na televisão que o pastor havia insistido em que ela pagasse o carnê de gideão para seu filho, mas ela não o fez e o filho sofreu um acidente e perdeu as duas pernas. Um pai põe para fora de casa a filha que se perdeu, ou seja, entregou-se ao namorado. O marido espanca a mulher porque bebeu demais. Filha mata pai e mãe, porque eles não concordavam com o seu namoro com um marginalzinho qualquer. Nas favelas da cidade do Rio de Janeiro, o tráfico impõe suas leis e mata repórter que fazia matéria sobre o seu poder. No Iraque, diariamente, os terroristas explodem bombas presas em seu corpo e matam, ferem e mutilam dezenas de pessoas. Isso porque um presidente americano destruiu a nação iraquiana para depor o tirano que governava o país com mão de ferro. Os exemplos vão do mais simples ato de racismo até as mais cruéis guerras de extermínio. E são todos exemplos de barbárie do ser humano contra o ser humano. Assim está a humanidade, neste começo do século XXI. Mata-se, tortura-se, fere-se, humilha-se com a mesma desfaçatez de alguns milhares de anos atrás. A evolução humana no quesito barbárie ainda está no começo. A ética que prevalece ainda é a da força bruta, da bestialidade. As concepções filosóficas e religiosas, sejam ocidentais ou orientais, continuam pregando a paz, o amor entre os humanos, a compaixão, mas o ser humano permanece o mesmo e, às vezes, tem-se a impressão de que piora a sua capacidade de destruir a si mesmo e a seu semelhante. Porque são éticas inúteis, não correspondem à realidade, não contribuíram em nada para a evolução humana, com suas metafísicas ordinárias, com seus deuses sanguinários, com suas prédicas que condenam ao fogo eterno aqueles que não comungam com suas cartilhas absurdas e estúpidas. Não há que ter complacência com esse tipo de filosofia. Não há que ter complacência com essas religiões idiotas e idiotizantes. Qualquer tentativa de aceitar como positivas tais crenças só faz perpetuar o estado de barbárie em que vive a humanidade sob o domínio das forças metafísicas que valorizam a morte e pregam a vida além-túmulo como solução para as mazelas e os tormentos do ser humano. São todas as metafísicas um mal que precisa ser combatido até ser erradicado da mente humana, embora se saiba que tal tarefa seja quase impossível. No entanto, assim como começaram do nada as inúteis buscas da essência dos seres, é necessário que se comece também a buscar a exata noção do valor da vida, para que o materialismo ateu e objetivo, crítico e lógico, venha a estabelecer o seu império no pensamento humano. Essa a utopia a que volto sempre, porque é preciso repeti-la sempre, à exaustão, como o fizeram os religiosos que construíram ao longo do tempo um edifício que é difícil, sim, de ser explodido, mas que não é impossível de ser lentamente demolido por uma posição radical contra todas as metafísicas.

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