Pensar dialeticamente constitui uma interessante ferramenta para tentar entender a existência. Mas, pode também conduzir a armadilhas simples. Somos levados, por exemplo, a raciocinar que, se há uma “existência”, deve haver uma “não-existência”, ou seja, acabamos contrapondo o ser ao nada. Criamos, então, uma categoria, ou seja o que for, um ente, chamado nada. E o que é o nada? Debruçaram-se os filósofos sobre a questão, desafiaram-se em busca da explicação para o nada, à exaustão. Muitos neurônios queimados depois e alguns séculos de busca não redundaram em absolutamente nada. Ou seja, só existe o nada quando os filósofos discorrem sobre ele. É um ente inventado, que só existe na linguagem, na abstração da linguagem. Posso, com a linguagem, inventar o que eu quiser. Por exemplo, os carbuncos. São um povo originário do planeta Arguidelo, aqui trazidos por um desastre de sua nave espacial, que ia em direção a uma outra galáxia e sofreu uma pane, tendo a desgraça de cair justo no planeta Terra. Estabeleceram-se, há milhares de anos, na ilha de Chipangó, e ali permaneceram. São homúnculos de orelhas redondas, única característica que os distingue dos demais humanos, além da tendência à pouca altura, embora não sejam anões. Vivem da terra e seu principal alimento foi trazido de seu planeta de origem: é uma raiz muito saborosa e rica em nutrientes, chamada naiperê. Os carbuncos não são muito sociáveis e, por isso, permaneceram isolados até há pouco tempo. Com o contato com a civilização humana, estão-se descaracterizando e entraram em processo de extinção. Pronto: aí está um povo que pode interessar a muitos estudiosos. Pode-se objetar: mas o carbuncos não existem. Ora, claro que existem: acabei de inventá-los. Assim também o nada: existe a partir do momento em que o inventaram. E mais não digo sobre isso, porque muita tinta já se gastou para tentar chegar ao conceito do nada, para justificar a criação do mundo, a existência de deus (outro nada) e para justificar mil e uma bobagens da crença metafísica de que há um mundo das ideias, um mundo ideal, abstrato, que se contrapõe ao mundo físico. Como se, com o mundo físico, já não tivéssemos problemas demais para resolver, em todos os campos do conhecimento humano. Não conheço um único ser humano que se tenha beneficiado realmente com a propalada existência desse mundo ideal ou com a concepção filosófica do nada, a não ser os pobres filósofos da imponderabilidade, melífluos seres em permanente estado de flutuação mental pelas paisagens do mundo, ou seja, os metafísicos. E gostei tanto dessa última frase, que gostaria que ela fosse realmente a última desse parágrafo, mas acabei de estragar isso, ao fazer tal comentário.
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187 - PALAVRA FINAL: O ALÉM DO HOMEM
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